Autora: Ursula Ribeiro de Almeida
A legislação prevê prazo para realização das deliberações das sociedades, cuja finalidade é garantir a participação dos sócios/acionistas/cooperativados nas decisões sobre matérias relevantes e a transparência em relação a terceiros quanto às atividades sociais. Para as sociedades anônimas de capital aberto – ou seja, aquelas que têm ações negociadas na Bolsa de valores ou mercado de balcão –, a disciplina legal é ainda mais rigorosa para garantir a proteção do investidor.
Em regra, as deliberações são realizadas em assembleia com a participação dos sócios/acionistas/cooperativados, administradores, diretores e, se houver, membros do conselho de administração e do conselho fiscal. Todavia, a pandemia de COVID-19 impossibilita a realização de assembleias presenciais em razão do risco de contaminação. Ademais, as medidas de isolamento social abrangem as juntas comerciais, que têm suas atividades suspensas ou reduzidas, impossibilitando o registro de atos sociais.
Diante da dificuldade de se cumprir os prazos legais para realização de assembleias e arquivamento de atos societários, a Presidência da República editou a Medida Provisória n° 931, em 30 de março, para alterar alguns dispositivos do Código Civil, da Lei das Sociedades Anônimas e da legislação que disciplina as sociedades cooperativas.
A Roncato Advogados sintetiza as principais alterações, que impactam diretamente no regular funcionamento das empresas privadas e públicas.
O Presidente da República tem poder constitucional para editar ato normativo, a Medida Provisória, com força de lei em caso de relevância e urgência. A MP tem eficácia de até 120 dias, sendo este o prazo para o Congresso Nacional apreciá-la e: a) aprová-la nos mesmos termos em que consta no texto elaborado pela Presidência; b) aprová-la com emendas; ou c) rejeitá-la. É possível ainda que o Congresso não realize a votação no prazo de 120 dias e, nesse caso, ela deixa de produzir efeitos legais.
Dessa forma, a MP n° 931/2020 produz efeitos desde a data da sua publicação no diário oficial em 30 de março, mas depende de aprovação pelo Congresso Nacional para que seja convertida em lei. Entendemos que a rejeição da MP, ou a não deliberação no prazo de 120 dias, não prejudica aquelas sociedades que pautaram a sua conduta com base na MP n° 931/2020 no período da sua vigência, pois está configurado o risco iminente à saúde para se cumprir os prazos legais para realização de assembleias presenciais, assim como a impossibilidade de se registrar os atos sociais.
A MP n° 931/2020 modifica de forma global a disciplina legal das sociedades anônima, limitada e cooperativa quanto ao registro de atos na Junta Comercial e a forma de deliberação em reunião ou assembleia.
Junta Comercial. Durante o período de vigência das medidas restritivas de atendimento ao público nas juntas comerciais, modificam-se as seguintes previsões legais:
Destacamos que cada junta comercial estadual deve tornar pública, com antecedência, a data de retorno das suas atividades regulares para que as sociedades regularizem os arquivamentos dos seus atos.
Deliberação à distância. Diante da necessidade do isolamento social para evitar a contaminação por coronavírus, as sociedades podem optar por realizar reuniões e assembleias para tratar de questões urgentes, especialmente no contexto de crise econômica sem precedentes. Para viabilizar a realização dessas deliberações, a legislação autoriza a participação e votação à distância em reunião ou assembleia das sociedades anônima, limitada e cooperativa.
A maior parte das empresas de grande porte é sociedade anônima em razão do seu modelo mais adequado para aporte de capital e do aparato legal que acomoda uma complexa estrutura de administração e fiscalização da atividade dos seus gestores.
A flexibilização das regras quanto aos prazos legais prevista na MP n° 931/2020 se aplica a todos os tipos de sociedades anônimas, sejam elas empresas privadas, públicas ou sociedade de economia mista.
Prorrogação do prazo da AGO. O artigo 132 da Lei n° 6.404/76 prevê que a Assembleia Geral Ordinária (AGO) deve ser realizada no prazo de 4 (quatro) meses, contados a partir do término do exercício social. De acordo com a MP n° 931/2020, para o exercício social que se encerra entre 31/12/2019 e 31/03/2020, a AGO poderá ser realizada, excepcionalmente no prazo de 7 (sete) meses. O atraso na realização da AGO produz efeitos diretos na administração da sociedade, que a medida provisória também regulamentou:
S/A aberta e CVM. A MP n° 931/2020 atribui ampla competência à Comissão de Valores Mobiliários – CVM para alterar os prazos legais estabelecidos para as sociedades anônimas de capital aberto na Lei n° 6.404/76.
Local da assembleia. Em regra, a assembleia é realizada presencialmente na sede da companhia, porém em situações excepcionais – como ocorre na pandemia de coronavírus – ela pode ocorrer em outro local no mesmo Município, desde que seja informado com clareza nos atos de convocação. Para as companhias abertas, a CVM pode autorizar até mesmo a realização de assembleia digital.
A maior parte das empresas brasileiras é sociedade limitada porque se permite que um ou mais sócios, com certa relação de proximidade, reúnam esforços para desenvolver atividade empresarial, preservando a limitação da responsabilidade às respectivas quotas. A organização de estrutura administrativa das limitadas permite a utilização de modelo simplificado em que os sócios exercem diretamente a administração, sem a obrigatoriedade da existência de conselhos ou outros órgãos de fiscalização.
Prorrogação do prazo da AGO. Assim como nas sociedades anônimas, a MP n° 931/2020 prorrogou o prazo para realização de AGO, quando esta é obrigatória, para 7 (sete) meses para aquelas limitadas cujo exercício social se encerra entre 31/12/2019 e 31/03/2020.
A MP n° 931/2020 prorroga de forma equivalente o prazo (7 meses) para realização de AGO para sociedade cooperativa e entidade de representação do cooperativismo, assim como prorroga o mandato dos órgãos de administração e fiscalização até a data da realização da AGO.